23
fev
2011

rascunho

matéria frágil é o amor, amor. por exemplo: uma bomba nuclear e ele já era. por isso todo casal deveria antes, durante e depois de tudo ser amigo. só a amizade e as baratas sobreviverão ao fim do mundo do amor.

outra: encantamento é a coisa mais importante do mundo (petróleo nada, os carros são movidos a encantamento). é claro que acho a criatividade a coisa mais importante do mundo, mas vida deveria ser um pedaço de criatividade cercado de encantamento por todos os lados. quero dizer, criatividade é a chama, conquanto encantamento é o fósforo, a caixinha, o sambista… e o paiol.

michelangelo sabia das coisas, vide “a criação do homem”. assim, todo teto é potencialmente uma capela sistina. em suma, encantamento é algo frágil. encantamento é um bichinho de pelúcia que fala, anda e sente e pensa. é uma pessoa de pelúcia. é a pessoa mais linda do mundo de pelúcia. a pessoa mais linda do mundo nua e de polainas de pelúcia. e te amando. encantamento é tesão lírico – ou tesão e lirisimo. mas é frágil como qualquer coisa que morre. cuide do seu encantamento sob risco de virar cimento – ou rima vã. aliteração – ou renavam. enfim, figura de linguagem, retórica, balela, baleia… pois a sombra do encantamento é pesada e esperneia. esmaga sem maldade, mas esmaga, atropela, pisa. tem gente que a gente vê no olhar a sombra do encantamento repisando.

lembrei dos paralamas: “cuide bem do seu amor”. ao contrário dos filmes e do desejo popular, se tiver de ser será, etc, o amor é o eterno pique até a porta do elevador fechando. quer dizer, torça para que tenha alguém lá dentro, que te ouça gritar “segura, por favor!”, e, fundamentalmente, corra na direção dele(a).

porque amor é vida na plenitude, assim, caminha para a morte, seu mar é o fim. delicado jogo esse, sobre o arame sobre o abismo sobre o poema sobre a página sob os olhos. em que aquilo é tudo na vida e ainda se tem a vida inteira – não no sentido de tempo, mas espaço. por isso o casamento é meia pedra no caminho andado para o andor de barro da dor do fim do amor.

há que se ter destreza para equilibrar tantos contorcionistas chineses, bigornas de cristal, tratores de papel, jumbos de mel… o amor é tão sinistro que te faz viver por contraste, oximoro velhaco – vide o texto.

o amor é o eixo da desmáquina. o amor é molhar a mão. o amor é qualquer coisa que qualquer um escreva, enfim. e esse é o perigo. e ainda bem. e ainda mal. e aí dá. mas quem sou eu para falar de roma?

19
fev
2011

doces bárbaros

14
fev
2011

crença

deus, não entendo.
curioso acho graça.
quando lembro acredito.
10
fev
2011

passando portas - luiz gabriel lopes

03
fev
2011
já chegou fevereiro.
escuto "dias de janeiro" e "6 minutos".
acabou o cigarro.
isso é pra dormir sem poesia e sem reverberação.


01
fev
2011

na infância pratiquei com fervor a adoração ao tigre; não o tigre cor de pêssego dos camalotes do paraná e da confusão amazônica mas o tigre rajado, asiático, real, que só pode ser enfrentado pelos homens de guerra, encastelados sobre um elefante. costumava demorar-me infindavelmente diante de uma das jaulas no zoológico; apreciava as vastas enciclopédias e os livros de história natural pelo esplendor dos seus tigres. (lembro-me ainda dessas figuras: eu que não posso recordar sem horror o rosto ou sorriso de uma mulher). a infância passou, caducaram os tigres, e a paixão por eles, mas eles ainda permanecem em meus sonhos. nessa lembrança submersa ou caótica, continuam a prevalecer, e assim: adormecido, um sonho qualquer distrai-me e eu sei de imediato que é um sonho. costumo então pensar: este é um sonho, uma pura diversão de minha vontade e, já que tenho um poder ilimitado, vou produzir um tigre.

oh incompetência! meus sonhos nunca sabem engendrar a apetecida fera. aparece o tigre, isso sim, mas dissecado e débil, ou com impuras variações de forma, ou bastante fugaz, ou tirante a cão e a pássaro.

jorge luis borges

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